Hospitais usam o design e a natureza para ajudar a curar os pacientes
Muito mais do que um elemento decorativo, o design dos ambientes têm um profundo impacto em nosso sistema cognitivo, desencadeando uma série de emoções de acordo com os materiais, cores e níveis de iluminação percebidos.
Essa realidade tem sido levada a sério por muitas empresas, que cada vez mais investem em projetos arquitetônicos modernos, fazendo uso de vegetação e muita luz natural como forma de estimular os funcionários e manter altos níveis de desempenho e satisfação.
Mas é nos hospitais que o uso desses elementos vem apresentando impactos ainda mais significativos, auxiliando pacientes em seus momentos mais difíceis. A associação da imagem das clínicas a fatores como doenças, dores e clima hostil tem levado diversos profissionais das áreas da saúde, arquitetura, engenharia e design a pensarem em alternativas mais humanizadas para a formatação dos hospitais – sem deixar de lado todos os aspectos técnicos essenciais.
Mais do que uma forma de gerar conforto e acolhimento para aqueles que necessitam de tratamento médico, a preocupação com questões estéticas e a concepção humanista têm produzido efeitos positivos mensuráveis na cura dos pacientes.

A natureza como fonte de cura
Estudos realizados por profissionais como Roger Ulrich compararam a recuperação de pacientes em períodos pós-operatórios. Neles, um primeiro grupo teve vista para a paisagem com árvores, enquanto um segundo observou apenas as paredes do cômodo.
O grupo com contato visual com a natureza apresentou melhor recuperação, menos comentários negativos por parte das enfermeiras (sobre seus status clínicos), redução das complicações pós-operatórias e menor necessidade de analgésicos.
A presença de plantas e jardins comprovadamente reduz os níveis de estresse dos pacientes (e também dos familiares envolvidos no tratamento), pelo simples fato de estarem em contato com a natureza. Outros efeitos citados nas pesquisas de Ulrich incluem ainda diminuição da pressão arterial e da dor (além de maior tolerância a essa) e tempo de recuperação reduzido, que consequentemente diminui os gastos operacionais dos hospitais e clínicas responsáveis pelos pacientes.
É um benefício de duas mãos que auxilia inclusive nas questões de sustentabilidade do hospital, favorecendo a redução de consumo de energia do estabelecimento.


Agora que você já sabe um pouco sobre o potencial dessa relação entre design, cura e a natureza, vamos explorar um pouco mais as ferramentas que estão à sua disposição para criar soluções arquitetônicas capazes de melhorar a qualidade do ambiente, deixando o conceito tradicional de hospital para trás.
Características arquitetônicas para integração entre interior e exterior
Os projetos que fazem uso de elementos naturais são frequentemente associados ao termo biofílico, o qual remete à ideia de incorporar ao design nossa preferência por estar em contato com a natureza. Isso inclui, como dissemos, a questão da luz do Sol, do uso de plantas, de belas vistas e paisagens, capazes de proporcionar aos pacientes de um hospital uma estadia mais confortável e tranquilizante.
Entre as características que ajudam a construir a ligação entre os espaços externos e internos podemos citar:
- Uso de janelas amplas, com vista para o ambiente externo
- Paisagismo, com utilização consciente dos espaços externos e internos
- Aproveitamento de luz natural durante o dia para iluminação dos ambientes
- Combinação de Metais como o cobre e pedras no exterior para garantir conforto térmico
- Uso de painéis de madeira para a decoração
- Colocação de quadros e pinturas que remetam à natureza de forma realista
Vamos falar um pouco mais sobre cada uma delas e como elas foram aplicadas em projetos reais na sequência.


Soluções no Projeto Arquitetônico que auxiliam na integração do ambiente hospitalar com a natureza
A solução mais comum para iniciar a integração entre o espaço interno do hospital e a natureza é a adoção de grandes janelas e fachadas de vidro. Em primeiro lugar, elas dão a sensação de amplitude para o espaço, reduzindo de imediato a sensação claustrofóbica passada por muitos dos hospitais mais tradicionais, que quase não oferecem vista para o exterior.
O geógrafo Jay Appleton publicou teses relacionando a nossa natureza caçadora e coletora à preferência por vistas expansivas, com perspectiva e longas linhas de alcance. Apesar de importante, a noção de espaço também precisa ser equilibrada com ambientes mais reservados para que os procedimentos e certos casos sejam tratados com a devida privacidade, sem interrupções.
Essa dicotomia é atacada de frente por projetos como o do Centro de Câncer da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, que utiliza painéis perfurados de cobre com tripla função: dar visibilidade de dentro para fora, manter a privacidade dos pacientes e auxiliar no conforto térmico do prédio.


O conceito aberto é especialmente útil nas áreas comuns de circulação e na recepção, facilitando a navegação entre os setores e permitindo uma visualização completa das diferentes áreas. Sobre as janelas e o uso de vidro, outro efeito positivo é a entrada da luz solar, que ajuda a criar um clima mais confortável para os pacientes internados.
Novamente, estudos mostram a redução do tempo de permanência dos pacientes expostos à luz solar.


Crie seu próprio espaço verde
A utilização de plantas, principalmente árvores, é importante para os hospitais por uma multitude de fatores. Suas cores e formas capturam a atenção dos observadores, dando mais vida à paisagem e gerando contrastes em relação à construção. Principalmente em ambientes externos, elas costumam abrigar espécies de animais como pássaros, citados em pesquisas como elementos calmantes, propícios para a meditação e relaxamento.
Isso é especialmente verdade quando temos a combinação do som das folhas ao vento, dos animais e de água corrente – algo possível com a instalação de fontes artificiais, tanto no interior quanto no exterior. As plantas auxiliam também em questões como a qualidade do ar e conforto sonoro, podendo absorver parte do eco provocado por longos corredores ou salas vazias.
A localização geográfica dos hospitais pode não favorecer a proposta de trazer natureza aos olhos dos pacientes. Em grandes centros urbanos, por exemplo, na maioria das vezes não há como trabalhar com amplos terrenos e vistas agradáveis.
Por isso, uma ideia é criar o espaço verde dentro da própria construção. Essa foi a solução do Hospital Metodista de Kalamazoo, Michigan – cuja estrutura sempre fica à sombra da neve do lado Michigan. Observe como as alas da construção partem desse grande centro verde:


Na hora de escolher as plantas, atenção em primeiro lugar à escolha de espécies não nocivas ou alergênicas. Em segundo lugar, deve-se pensar na perenidade da vegetação e na necessidade de cuidados (plantas frágeis podem gerar alto custo de manutenção). Um jardim com folhas secas e flores mortas pode gerar um efeito até contrário ao desejado, causando impacto psicológico negativo nos pacientes.
Uma forma interessante de reduzir os custos de manutenção das plantas no interior das construções é adotar mecanismos de captação de água da chuva. Essa foi a solução adotada pelo Hospital Infantil de Seattle, nos Estados Unidos. Para corredores não cobertos por outros pisos, a instalação de claraboias pode fornecer luz para as plantas e pacientes.


Fotografias e pinturas podem ajudar
Outra solução bastante útil em espaços menores ou que não permitam a colocação de elementos vivos é o uso de fotografias, arte realista e de imitações.
Em seu livro “The Shape of Green: Aesthetics, Ecology, and Design”, Lance Hosey explica que os padrões fractais, como aqueles dos ramos das árvores, surtem um efeito enorme em nossos cérebros, com potencial de redução do estresse de até 60%, a depender da situação.
O mesmo vale para mobiliários e designs têxteis que se assemelham aos encontrados na natureza, tendo capacidades estimulantes e relaxantes, simultaneamente, segundo o autor.
Outras das soluções arquitetônicas voltadas à integração entre interior e exterior nos hospitais, elencadas por especialistas, são jardins de entrada e terraços decorados.






Elimine os fatores geradores de estresse
Além da integração do ambiente interno a elementos naturais, é importante considerar outros fatores na hora de elaborar o projeto, principalmente quando falamos de hospitais. Invista em painéis que auxiliem na absorção sonora, evitando os ruídos e reverberação excessiva. Isso passará mais conforto para as pessoas, trazendo uma sensação mais hospitaleira em substituição à frieza das clínicas tradicionais, com seus longos corredores preenchidos pelos sons dos aparelhos.
Priorize a utilização de elementos decorativos e cores que destaquem seções diferentes da edificação, facilitando a localização dos pacientes durante o deslocamento entre as diferentes alas e espaços. Essa é mais uma oportunidade para colocar em prática o paisagismo.
Como os equipamentos médicos podem gerar ansiedade nos pacientes, uma alternativa interessante é tentar abrigá-los ao máximo dentro de móveis e estruturas planejadas, de forma a tornar o ambiente mais reconfortante. Foi uma das soluções implementadas pelo Christ Hospital, localizado em Cincinnati, Estados Unidos:


Outros pontos a serem considerados como potenciais geradores de estresse são a falta de privacidade, baixa qualidade do ar (com sujeira, poluição e pouca renovação) e a iluminação forte demais. Ao contrário do que muitos imaginam, nem sempre mais luz é a melhor opção.
Hospitais que já estão fazendo a diferença
Muitos dos elementos que listamos até aqui já estão sendo aplicados em projetos ao redor do mundo, trazendo como proposta mais segurança, qualidade de vida e conforto para os pacientes. Confira abaixo alguns dos exemplos selecionados pelo site Fast CoExist, todos vencedores do Prêmio de Design American Institute of Architects (AIA) National Helthcare.
1. Kaiser Permanente, Centro Oncológico Kraemer
Projeto: Yazdani Studio of CannonDesign


Sediado em Anahein, California, este centro de tratamento contra o câncer traz uma proposta diferente para seus pacientes, que já sofrem com o estresse acumulado pelo risco da doença e pela severidade do tratamento. Em vez de colocar as instalações no subsolo como forma de conter a radiação dos equipamentos, eles investiram em paredes sólidas com três camadas de concreto, localizadas no centro da edificação, no piso térreo.
Em redor da construção, paredes de vidro levam luz do Sol a todos os demais cômodos, realçando as cores interiores e criando uma experiência mais relaxante. Do lado de fora, belas paisagens podem ser observadas da recepção. Cada acomodação tem o seu próprio jardim zen, repleto de plantas e muros verdes.
A densidade do vidro utilizado nas laterais e os padrões de jateamento ditam a transparência, dando visibilidade ou privacidade quando necessário, fazendo uma perfeita integração entre interior e exterior. O projeto foi pensado desde o início a partir dos impactos positivos que os ambientes humanizados têm sobre a velocidade de cura dos pacientes.


2. The Christ Hospital Joint and Spine Center
Projeto: Skidmore, Owings & Merrill


Construído em 1889, o Christ Hospital tem uma arquitetura que alia o melhor do clássico ao moderno, com tijolos na fachada criando uma vista acolhedora, enquanto amplas janelas dão uma noção de espaço, permitindo que os pacientes apreciem os ambientes arborizados e tranquilos do hospital. Localizado em Cincinnati, o destaque do projeto vai para o jardim superior, no qual os pacientes podem relaxar e apreciar uma vista estonteante.


Nos quartos e corredores, a luz natural está presente ao longo do dia todo, dando um clima de hotel. A maior parte dos equipamentos fica abrigada em armários. Com a chegada da noite, cortinas blackout impedem que as luzes artificiais da cidade atrapalhem o sono dos internados.


A construção tem certificação LEED, sendo um bom exemplo no quesito sustentabilidade e utilização eficiente dos recursos energéticos.
3. Memorial Sloan Kettering (MSK) – Ambulatório Regional de tratamento ao Câncer – West Harrison, Nova Iorque
Projeto: EwingCole


O projeto do MSK CC adotou as práticas do design biofílico à risca, transformando um hospital de puro tijolo e metal em um local extremamente convidativo, repleto de luz natural e tranquilidade, digno da certificação LEED. Todas as 18 salas de tratamento dão aos pacientes uma vista direta da paisagem externa, com árvores e muito verde.


Padrões de circulação únicos separam o acesso a diferentes serviços do prédio, sem forçar todos os pacientes a atravessarem uma recepção única. Os serviços gerais, por exemplo, são acessados por uma ponte construída com vidro e metais, que não atrapalham em nada a iluminação dos cômodos situados logo abaixo.


Aliás, o uso de vidro e de “cortes” na planta da edificação é o que garante a passagem da luz do sol, iluminando todas as partes do MSK de forma eficiente. Nos quartos, apenas o necessário fica à mostra, com todos os equipamentos, cabos e outras tecnologias ocultas da visão do paciente, que observa mais uma vez cenários com o melhor do paisagismo.


A utilização de vidro no interior garante acessibilidade visual e garante a todos uma referência clara em relação às estações de informações.
4 – Centro de Câncer da Universidade de Arizona (UACC)
Projeto: ZGF
Sediado no Centro Médico do Hospital de St. Joseph, em Phoenix, Estados Unidos, este centro de tratamento é nosso último exemplo de hoje sobre como promover a integração entre interior e exterior. Seus painéis externos são confeccionados em cobre, resfriando a construção de fora para dentro.


Perfuradas, essas estruturas aproveitam a luz natural na medida certa, propiciando privacidade e proteção a quem precisa utilizar os tratamentos oferecidos no local. Elas evitam reflexos ao mesmo tempo em que ainda garantem visibilidade para a paisagem do local.


Estes foram apenas alguns poucos exemplos do que vem sendo feito mundo afora. Você também não gostaria de ter uma experiência mais humana na próxima vez em que precisasse de um hospital? O melhor é começar a projetar pensando nesses conceitos agora mesmo.
Caso queira se aprofundar ainda mais no assunto, recomendamos o estudo Gardens in Healthcare Facilities: Uses, Therapeutic Benefits and Design Recommendations. Boa leitura!
Fontes: ZGF Architects, Ewing Cole, Harvard Business Review, Gardens in Healthcare Facilities: Uses, Therapeutic Benefits and Design Recommendations, Cannon Design, Fast Co., Health Design, Herman Miller